Falando com CHEF's - João Soto
Começo hoje uma nova fase do blog. Na
viagem à Espanha para fazer o Curso de Verão da Escola de Hotelaria Les Roches, em Marbella, conheci muitos amigos que assim como eu buscam conhecimento e
técnica na arte de transformar simples alimentos em verdadeiras iguarias, para o corpo e para a alma. Vou
começar com João Soto, de Curitiba. Conhecemo-nos logo no primeiro
dia, foi no voo de Lisboa para Málaga. Do primeiro contato surgiu uma amizade
bonita e com vários interesses em comum. Conversando contei minha história,
falei do blog e da vontade que tinha de contar a história de quem, como eu,
somou a gastronomia com sua outra vocação/profissão. O resultado está aí, uma
sonora e saborosa história, contada pelo próprio João.
Notas e acordes se transformam em sabores e aromas
Eu queria ser um candidato do programa Show
de Calouros, do Silvio Santos. Era o que pensava aos sete anos. Vivia abraçado
com a música, sonhando em soltar a voz por este mundo.
Meu avô Joanito, um acordeonista autodidata
de mão cheia, era meu maior motivador. Junto com meu pai, formamos um trio para
animar as macarronadas de domingo e as festas da família. Queríamos apenas
tocar e cantar até alguém dizer: "Está tarde, amanhã é segunda e a semana
vai ser cheia". Essa família paterna, de descendentes italianos, alegre e
conservadora, tinha o som do acordeon vermelho do meu avô misturado ao som do
raspar o fundo do tacho de polenta de minha avó Dilma.
Em minha família materna os sons eram
outros. Entre aqueles espanhóis alegres, brigões, latinos com sangue muito
quente mas muito amáveis, havia a Abuela Maria, que gostava de cantar e contar
histórias da guerra civil, e um Abuelo Carlos, que adorava cozinhar e beber um
bom vinho.
Como uma esponja, eu vivia no meio desses
sons, querendo absorver tudo, sentir e viver esse furacão cultural familiar.
Aprendi dar valor à música, à língua espanhola, à polenta caseira, ao bom
vinho, a uma bela paella e convivi com essas diferenças.
Não consegui realizar o sonho infantil de
cantar para o Silvio Santos. Durante anos, vivi de música, tocando em bares nos
finais de semana, estudando horas de saxofone e participando de grupos e bandas
com alguma visibilidade em Curitiba. Entretanto, o mundo da música profissional
é muito mais voraz: são muito poucos aqueles que conseguem viver só dela. Eu
sentia que era preciso trabalhar de verdade, ter responsabilidades e virar
adulto. Sempre ouvia alguém dizendo: "Música não enche barriga".
Foi aos 25 anos que percebi que o outro lado
da família, espanhol, que além de som também tinha perfume, gosto, poderia me
render um emprego estável. Comecei a prestar atenção na paella de meu abuelo, e
em seguida lembrar da polenta de minha nonna.
Passei a me dedicar à gastronomia e a
trabalhar com ela. Iniciei fazendo paellas sob encomenda. Queria encher a
barriga dos outros com a bagagem dos meus sabores familiares. Depois, trabalhei
lavando louça em um restaurante. Em menos de um ano e meio, eu já comandava a
cozinha desse mesmo restaurante e já tinha no cardápio pratos de minha autoria.
Dando um passo maior que as pernas, resolvi
abrir meu próprio negócio, um pequeno restaurante em um shopping popular da
cidade. Durou apenas dois anos. Faltava técnica, experiência e um modelo de
gestão que me desse segurança. Entretanto, aprendi muito enquanto batia cabeça
por lá.
Para buscar a segurança, era necessário
estudar e dominar o assunto de uma forma mais pontual. Resolvi fazer cursos e
ingressei em uma faculdade para ter um conhecimento mais formal daquilo que eu
já dominava, em algum grau, na prática. Me formei em gastronomia pela
Universidade Positivo e também fiz cursos fora do país.
Atualmente presto consultoria para
restaurantes, faço elaboração de cardápios e dou aulas de gastronomia para
amigos que queiram aprender a cozinhar.
Adoro minha profissão de cozinheiro, mas
continuo com a música ao lado, tocando e cantando para alimentar minha alma.
Consegui, dessa maneira, juntar a história das minhas raízes familiares. Sou
privilegiado por ter duas paixões e poder realizar as duas: música e
gastronomia.
Acredito que ambas tem um elemento comum e essencial para a vida,
que é a harmonia. Sem harmonia não existe música e não existe uma boa
comida, que alimente e preencha a alma com sabores, perfumes e lembranças. E,
sem isso, a vida não vale a pena.
Hoje, João já pensa numa pós graduação. Enquanto isso não acontece ele trabalha como personal gourmet, fazendo sua festa; ou então ministrando cursos em residências para quem quiser aperfeiçoar seus dotes gastronômicos. Uma coisa é certa, a canja nunca vai faltar, seja ela na música ou na cozinha.
Rua Atílio Bório, N° 740 ap. 20. bairro: Cristo Rei. Curitiba - Paraná.
Telefone é 041 9682-98-79/ ou 041 3308-98-79.
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